Se você está dando wallride hoje, é por causa de Natas Kaupas. Traduzimos essa do Chrome Ball Incident e tivemos que cortar um pouco, porque a entrevista original é gigantesca e na internet ninguém lê!
Descubra quem é o BFF de Natas, aprenda com o mestre a definição de estilo, saiba como fazer pra sua primeira foto de skate sair na capa da Thrasher e entenda de uma vez por todas que criatividade é tudo no skate.
Certo, Natas! Então, a lenda diz que você nunca havia pegado uma Thrasher na mão até aparecer na capa. Você acha que estar alheio à cultura do skate fosse, talvez, sua maior força? Ter seu próprio ponto de vista e ideias no skate ao invés de viver aquele status quo?
Definitivamente, sim. Eu vi revistas de skate antes, mas nunca tive nenhuma. Eu não gostava muito de ler aquilo. Muito daquilo não fazia sentido pra mim. Nós já tínhamos uma visão diferente do skate na minha área. A história de “playboys vs. skatistas”, que parecia ser a pauta de todas as revistas, não existia em Santa Monica. Todo mundo se misturava e fazia coisas diferentes.
Então, nesse sentido, eu sempre me senti um pouco diferente do que acontecia no skate. Tenho certeza que isso mudou minha abordagem sobre o que os outros estavam fazendo. De qualquer forma, nem tinha tanta gente andando mesmo…
É engraçado porque aquela é a minha primeira foto de skate, e foi pra capa.
Eu lembro das pessoas dizendo que aquilo era truque de fotografia, mas parece algo que saiu das suas raízes no surf. Você se considerava mais surfista do que skatista naquela época?
Eu me considerava mais “eu não ligo”. Era só uma criança, sabe? BMX, surf… Tudo. A gente andava muito de ski, e frquentávamos aula de mergulho e ginástica. Era meio que tudo mesmo. Eu era só uma criança me divertindo e deixava rolar.
Tinha uma galera lá perto que tinha patrocínio. Não eram esses caras de Dogtown que todo mundo conhece; era a geração dos caras mais novos, que vieram depois deles. Eu os via andando nas rampas e piscinas, eles eram bons de verdade. Eram mais velhos que eu, então eu sempre ia ver o que eles estavam fazendo. A gente brincava um pouco com fastplants wallrides naquela época. Olhando agora, acho que era algo bem local. Mas foi daí que os wallrides vieram.
Quando foi a primeira vez que você viu alguém dar um ollie?
Eram mais rumores no começo. Foi um desses caras mais velhos que falei, um local chamado Dan McClure. Foi aí que vi pela primeira vez. É engraçado porque ele não era tão bom no ollie, mas conseguia subir a guia na maioria das vezes e isso impressionava bastante. Eu acho bem louco.
Eu fiquei obcecado com isso. Eu lembro de ficar subindo degrau por degrau da casa dos meus pais. Dava um ollie pro primeiro degrau, depois descia e tentava dar um ollie pro segundo. Quando peguei o jeito, aquilo ficou grudado em mim.
Eu perguntei a mesma coisa pro Tommy Guerrero: Quando foi que você percebeu que as coisas que você fazia nas ruas, fora das pistas, era importante o bastante pra você continuar fazendo? Quando você percebeu as infinitas possiilidades da paisagem urbana?
Eu não era “anti-pista”. Acontece que a maioria delas tinha fechado. Eu não tive carta de motorista até os 18 anos, então ficava andando na frente de casa. Era divertido o bastante pra mim. Upland era a pista mais perto, e ficava a uma hora de lá. Del Mar ficava a duas horas. Era uma viagem pro dia inteiro se eu fosse pra alguma pista, então eu andava nas escolas perto de casa. Lugares como a Paul Revere e a Kenner… Lugares perto da minha casa. Esses lugares eram divertidos.
Você ouvia muita merda dos amigos skatistas, dizendo pra você parar de perder tempo na rua?
Na verdade, não. Houve alguns resmungos quando o primeiro vídeo da Santa Cruz saiu. As pessoas me chamavam de “skatista da praia” e coisas assim. Muito engraçado.
Mas era uma comunidade pequena naquela época. A gente apenas saía e andava em qualquer lugar. Se fosse uma piscina, andávamos na piscina. Se fosse uma rampa, era lá. Simplesmente não havia muitas pistas nessa época.
Como você conheceu o Mark Gonzales? Quais foram suas primeiras impressões? Ficou claro desde o começo que vocês tinham uma sensibilidade parecida quando estavam andando de skate?
Nós nos conhecemos na casa de um amigo comum, o Brandon Murdoch. Ele tinha um quarterzinho no quintal.
Eu lembro da gente andando lá e depois indo pra rua. É engraçado porque nós dois estávamos meio que fazendo as mesmas coisas. Não tinha muita gente andando na rua daquele jeito, então era bem incomum ver aquilo. Foi da hora porque a gente tinha pequenas diferenças nas coisas que tentávamos. Tipo, eu tentava alguma de frontside, e ele já tinha tido a mesma ideia, mas ia de backside. Muito divertido. Aí começamos a andar juntos.
É certo dizer que você e o Mark viviam em um mundo separado naquela época? Você disse que não tinha muita gente andando daquele jeito. Era comum vocês saírem pra andar com outros profissionais e eles acabarem sentando pra assistir?
Isso acontecia. Mas também tinham vezes que eu ia andar com caras tipo o Hosoi; ele sempre estava na vizinhança. A gente ia andar e ele fazia aquelas manobras diferentonas na rua, mas você percebia que era engraçado pra ele estar fazendo aquilo. Tipo, ele estava só curtindo as manobrinhas na guia.
Parecia uma novidade pra ele?
É, mas a diferença é que eu continuava fazendo isso e tentando coisas novas. O Mark também. Era legal porque o Mark vinha semana sim, semana não, e a gente podia ver como estava a evolução das manobras. Mas não estávamos fazendo aquilo por obrigação. Era natural a gente fazer todas aquelas coisas diferentes. O foco era a diversão.
Então vocês não andavam juntos todo dia. Vocês se encontravam de semana em semana pra ver como estavam as coisas, é isso?
É… De semana em semana a gente conseguia se encontrar e partia nessas longas missões em cima do skate. Andávamos direto por 24 horas e depois nos separávamos.
Havia um sentimento de competição amigável ou era mais só camaradagem explorando as coisas novas? E vocês tinham alguma ideia de como o que vocês estavam fazendo seria tão importante depois?
Eu não via importância nenhuma e duvido que ele tenha visto. Na verdade, eu achava o contrário, tipo “nós podemos continuar fazendo isso e ninguém vai ligar”. Era só pra nossa diversão. Acho que essa era a motivação.
Algumas coisas viravam até piada, tipo: “Você consegue dar um ollie de back to tail no banco, voltando na posição do rocket air?” – “Vou tentar”.
Muita coisa era esse tipo de loucura. Nunca pensamos em ver aquilo em revistas um dia. Era mais uma questão de saber se conseguíamos ou não fazer tal coisa. Nós sabíamos que, se alguém estivesse assistindo, tentaria coisas diferentes com aquilo. Mas a gente não ligava. Era uma festa só nossa.
Você acha que vocês estavam prontos pra fama que ganharam na época? Puxa-saquismo do dia pra noite e infinitos pedidos de ollie devem ter te deixado maluco.
É, mas eu gostaria de ter sido mais maduro quanto a isso, também. Eu era muito novo mas, definitivamente, poderia ter aproveitado mais as oportunidades que tive e as pessoas que conheci.
A parada é que eu comecei a andar de skate pra não precisar ficar perto de gente. Não era uma atividade social pra mim quando, de repente, começou a ser o centro das coisas. Mas eu sempre estava tentando me esconder de algum jeito. Eu costumava viajar e andar em picos diferentes.
Você sabe que eu preciso te perguntar sobre os 360s no hidrante (no vídeo Streets on Fire). É verdade que aquela foi a única vez que você fez aquilo, e nem ligava tanto pra isso?
Sim, acho que aquela foi a única vez que fiz isso.
Não é que eu não gostasse. Era só um jeito de matar o tempo. Um amigo meu cortava o cabelo ali na Paper, Rock, Scissors. O lugar ainda existe, fica em Venice na frente do Pavillion. Pra passar o tempo enquanto alguém cortava o cabelo, a gente ficava rodando naquilo lá. Julien Stranger e Jesse Martinez também estavam sempre lá. Era mais pra ver quantas vezes você conseguia girar, não era uma manobra.
Quando o Scott Dietrich e sua equipe vieram filmar pro Streets on Fire, eles me pediram pra girar no hidrante. Eu nem sabia como eles sabiam daquilo, mas eu falei pra ele que a gente ainda não sabia como sair dos giros andando. Mas eles queriam, então eu tentei. Queimamos muito filme tentando imaginar como sair dali. Você consegue ver quando eu tive que pegar o poste pra desacelerar e usar a força. Era a única maneira de sair. Eu não queria dar giros estranhos e lentos. Queria que fosse da hora, fluído.
Eu não tinha ideia do tamanho que isso ia tomar. Eu nunca imaginei que um dia isso estaria no Tony Hawk´s Pro Skater e todo mundo me conheceria por causa disso.
O seu último anúncio da 101 (marca criada por Natas e Steve Rocco), antes de zuar o tornozelo, foi aquele nollie fifty. Provavelmente, a primeira vez que vi alguém entrando em outra manobra de nollie. Os nollies e manobras de switch eram seu próximo passo, caso você não tivesse se machucado? Salman (Agah) já disse que ficou inspirado a dar nollies depois que viu você mandar um em um banco. Você tinha alguma ideia de que esse era o caminho que o skate ia seguir?
Legal isso aí do Salman. A parada do switch foi divertida, mas acho que eu não ia levar muito pro lado técnico. Eu nunca fui muito técnico… Era sempre uma coisa de altura. Power moves.
Os nollies eram legais, apesar disso. Vir na velocidade e dar um. Mas é assim com tudo no skate: assim que você aprende uma manobra, você imagina como é dar aquilo de switch e tal. Não é algo de gênio nem nada. É apenas divertido fazer as coisas do jeito errado, especialmente naquela época.
Você acha que ia entrar numas de pressure flips e late flips, que ficaram muito populares logo depois que você se machucou? Ou isso te dá arrepios?
Eu ainda estava andando quando isso começou a rolar. Eu gostava do late shuvit, na verdade. Era legal, e você podia mandar um e entrar num lipslide, num boardslide.
Já os pressure flips… Putz. Meio desleixado. Nunca foi minha parada.
Ainda me lembro de ficar revirando os fundos das lojas, tentando achar alguma coisa do tamanho certo, rodinhas maiores que 45mm ou shapes de, pelos menos, oito polegadas. Esse tipo de coisa ficou impossível de achar por um tempo. Tínhamos que andar em skates porcaria porque, pelo menos, eles eram um pouco maiores que os outros. Eu me sentia um brinquedo; um cara grande num skatinho pequeno. Eu nunca tive essa agilidade. Sempre me movia lentamente, ainda mais depois que zuei meu tornozelo. Então, aquelas rodinhas minúsculas não ajudavam.
Me pediram pra te perguntar sobre corrimãos, mas isso tem relação com o fato de você ter feito um model de tênis ainda muito novo. Essas duas coisas, os corrimãos e o tênis, são duas características de como os garotos veem o skate hoje em dia. Obviamente, você deve ter orgulho dessas duas coisas, mas tem alguma parte de você que sente que você acordou um monstro?
(risos) Eu entendo o que você diz, mas gosto de pensar que isso aconteceria comigo ou sem mim. É a evolução natural das coisas. Eu acho legal.
Não há um órgão que governe ou faça um ranking do skate. Ele meio que se coordena sozinho. Mas, se você é bom o bastante, interessante o bastante e os designers são bons o bastante pra fazer seu tênis ou seu shape, você vai se dar bem. Você só tem que fazer o que sabe, e tudo acontece por si só.
Quantos aos corrimãos, é adrenalina. Agora está nesse nível de maluco, mas tenho certeza que também é a mesma coisa pra esses caras. Eu nunca desafiei a morte como eles fazem hoje. Descer corrimãos em que você pode morrer de verdade.
Nós fomos apenas os pioneiros. Você consegue olhar pra trás e até achar aquilo lá “bonitinho”, manja? É engraçado. Mas acho que tudo isso foi o curso natural das coisas.
Nós tocamos nesse assunto quase na entrevista toda, então vamos à raiz: Como você definiria a palavra “estilo”?
Na verdade, eu acho que está ligado à personalidade da pessoa. Estilo e personalidade são muito similares. O estilo de alguém parece realmente a personalidade saindo dela. É quase como se quando você gosta do estilo de alguém, você provavelmente se daria bem com a pessoa. Você pode passar um tempo com ela, almoçar junto e gostar dela, como pessoa. Mas, se o estilo da pessoa não te agrada muito, você provavelmente não se daria bem com o cara.
É mais do que estética, de certa forma. É quase como a essência da pessoa.
Ótima resposta. Certo, Natas, vou ter que encerrar por aqui. Gostaria de adicionar algo? Algum sábio conselho que você gostaria de colocar aqui?
Sem muita sabedoria, mas foi divertido. É legal ver que as pessoas ainda se lembram e se importam. Isso é bem legal. Foram bons tempos, com certeza.
entrevista por Chops – The Chrome Ball Incident
tradução por Felipe Minozzi (Fel)