“Malditos sanguessugas”, “a Grobo mente” e “isso não é skate de verdade” são algumas das frases berradas em Caps Lock pela turma do mimimi quando o skate sai das mídias especializadas e vai para a TV, para o jornal, para os pés do Cauã Reymond ou para o raio que o parta. Mas o buraco, meu amigo, é bem mais embaixo.
Vamos por partes. Como eu já deixei bem claro no título, é preciso que todo skatista desse mundo entenda uma coisa: o skate não é seu, não é meu, não é de ninguém. E é de todo mundo (alarme de clichê ativo). Não importa há quanto tempo você anda ou o quanto você ame. Você não pode protegê-lo, impedir que essa ou aquela pessoa chegue perto dele.
Skatistas são a raça mais possessiva, ciumenta e chata do mundo. Obviamente, eu me incluo nisso. Não acredita? Vou dar dois exemplos, mas você tem que analisar com sinceridade:
1 – Um senhor de 70 anos andando de skate no Parque Villa Lobos, em São Paulo, com cotoveleira, joelheira, bundeira, capacete e luva é o quê? Style – pô, o vovô anda de skate, que foda! Se der um flip então, YouTube na hora. Troque ele por um cara de 25, 30 anos na mesma situação, cheio de equipamentos (incluindo a ridícula bundeira), e vira o quê? Prego. Ou, como eu gosto de chamar, um “mãe, faz bolo!”.
2 – Um moleque chega na pista e, de prima, sem aquecer ou testar o pop, acerta um nollie heel crooked shuvit out numa borda. Anda muito! Na hora de sair fora, pega o skate pelo truck, o nefasto mallgrab. Prego, otário. Sabe de nada, inocente. (se bem que, nesse caso, dá um pouco de ódio mesmo).
Agora que você já aceitou que somos preconceituosos, podemos continuar. Se você não concordou com os exemplos, já pode fechar essa página e procurar o Vaticano para dar início ao seu processo de canonização. Enfim…
Pra continuar a conversa, vou pegar o exemplo mais óbvio: skate na Grobo. Por que será que isso incomoda tanta gente? Eu concordo que dá vontade de fazer Harakiri, ou de esfaquear a família da pessoa que fica explicando as leis da física do ollie, mas você tem que entender que eles estão falando pra outro público, formado por gente que, quando vê o o vilão da novela na rua, quer espancar o ator. Às vezes, eles exageram na “leiguice”, mas a melhor reação é dar risada; xingar muito no Twitter não adianta. Eles até tentam chamar skatistas que entendem do assunto, mas enjaulados ali na cabine grobal todos tem que se adaptar ao formato e acabam não ajudando em nada. É uma bela porcaria, mas não é pra nós, que vivemos o skate 24 horas por dia, que eles estão falando.
“Eles só querem ganhar dinheiro com o skate”, outro irritadão dirá. Cara, olha só, eu também não tô fazendo a Black Media apenas por amor. Sinto lhe informar, mas a gente preza por um conteúdo de qualidade, autêntico e original pra ganhar acessos e, com isso, ganhar dinheiro pra poder viver disso feliz da vida. Eu já tenho quase 30 anos no meio da minha cara e não dá mais tempo de ficar fazendo as coisas só por amor. A Black Media é minha tentativa (e do Mug e do Caetano) de unir o útil ao agradável, fazendo algo que a gente acredite e acrescente de verdade ao skate. Assim como a Grobo quer ganhar dinheiro com o skate, eu também quero. E você também deveria querer, se acha que tem algo a oferecer. Anota aí: você pode querer ganhar dinheiro com o que você gosta. Como diria o Coringa: “Se você é bom em algo, nunca faça de graça”.
Quando alguém da Grobo anda de carro pela rua e vê um skatista a cada 50 metros, depois pega uma pesquisa e vê quantos skatistas existem no país, ele pensa o quê? Vou colocar esse brinquedo na minha TV, porque tem público pra isso. Normal.
Mas lembra que eu falei que o buraco é mais embaixo? Reclamações sem fundamento tem origem não em quem faz algo que você considera errado, mas em quem deixa de fazer.
Cadê os eventos profissionais? Alô, CBSK? Aquela lista de quem se profissionalizou no começo de cada ano deve tomar quase os 12 meses, pelo jeito. Aliás, alguém aí me explica o item “principais colocações em campeonatos”, “necessário” pra se profissionalizar no Brasa? É sério isso? 2014, negada! Mas o assunto “competições” vou deixar pra próxima.
O que seria dos profissionais brasileiros se não fossem eventos como o DC King of The Park, realizados somente com investimento das marcas? Mas esse assunto fica pra outro dia.
Cadê o investimento? Em vários anos andando e trabalhando com skate, já ouvi muito chororô de gente que não quer cortar a margem de lucro pra investir em mídia, em equipe, em material… Mas na hora de bater no peito e falar que investe no skate vira o King Kong. Boom boom boom. São poucos que fazem de verdade. Poucos mesmo, acredite em mim.
Cadê a valorização dos profissionais? E não estou falando só dos skaters, mas dos fotógrafos, videomakers, designers, editores… Pagar R$100,00 ou R$200,00 numa foto boa que demorou o dia todo pra sair não tem cabimento. Mas o problema é que tem gente que aceita, aí já vira um círculo vicioso difícil de quebrar; enquanto houver um palhaço trabalhando a troco de banana, os detentores da grana ficarão acomodados, pagando o mínimo necessário em troca de um trabalho, no máximo, medíocre.
Já vi muita gente falando que odeia a Nike (e outras marcas grandes que chegaram depois no skate, como Adidas, Converse…), mas na hora da porcaria dos X-Games ficam postando #vailuan. Porra, o Luan anda de Nike, meu bródi. E ele é menos skatista por causa disso? Não. Filho da puta, mercenário? Não. E você, está sendo incoerente? SIM. Ah, e ele também é da Flip, marca de skatista… Agora complicou, né? Você vai falar que o Pedro Barros, o cara mais possuído dentro de um bowl no mundo atualmente, é um bosta porque a Red Bull ofereceu uma grana boa pro cara? É mérito dele; o cara é foda e continua o mesmo de sempre, com dinheiro ou sem. Eu, por exemplo, gosto pra caralho do Lance Mountain (Flip também, aliás), acho o estilo do cara inacreditável. Ele também anda de Nike. Se uma marca quer entrar no skate, e deixar essa parte com quem realmente entende do assunto, qual o problema?
Não estou falando que a Nike é boa; eu nem sei como é o trampo deles nos bastidores, foi só um exemplo aleatório. Estou dizendo que, seja quem for, fazendo um trabalho bom, não-leigo, comandado por gente que realmente vive o skate e investindo nos lugares certos, na minha opinião, chegou pra somar. Quanto mais exposição no mundo, maior vai ficando o mercado. Quanto mais dinheiro girando, maior é a qualidade dos produtos. Ficar fechado numa panelinha é coisa de criança, e criança que não cresce fica pra sempre chupando o dedo e revendendo shape aos 40 anos de idade pra comprar arroz.
Se for pra falar coisas como “radical”, “show de skate”, “explosão de manobras” e outros termos leigos/coxinhas, sai fora. Se for pra não investir em quem anda de verdade, sai fora. Se for pra chupar o sangue e a grana de quem consome skate, sai fora. E se liga, porque agora nós temos a voz da Black Media pra chutar a bunda de tipos assim. Faz direito ou nem tenta fazer.
Você pode odiar as grandes marcas, mas essa campanha da Nike SB é GENIAL. Principalmente o filme da corrida; melhor propaganda de skate que já vi.
Você odeia marcas grandes e ama a Vans, por exemplo? Sinto lhe informar, a Vans é uma multinacional também, e das maiores. Tem tênis até pra cachorro hoje, se vacilar. DC, Volcom, Creature… Tudo que tem qualidade acaba ficando grande. A Lakai é gigante e olha o reflexo nos vídeos dos caras. Anota uma coisa aí: não é porque a empresa é grande que ela faz mal ao skate.
“Fel, seu filho da puta, você está defendendo que as grandes corporações fiquem no skate e façam o que querem?” Não, só estou tentando mostrar que, se o mercado fosse realmente bem estabelecido, com bases sólidas e (mais) marcas verdadeiras, comandadas por skatistas ou por quem entende o skate, isso não seria um problema. Seria tipo: “Deixa eles, pô. Olha que gracinha o Thiago Leifert explicando o que é um flip. Agora dá licença que vou ali na Skateshop De Verdade ver os três vídeos nacionais que saíram essa semana e comprar um skate bom de verdade por um preço justo.” Deu pra entender? O problema não são eles, somos nós. Nós nunca vamos conseguir lutar com uma Grobo da vida, talvez nem com uma Rede TV!, mas a gente consegue se arrumar aqui dentro, com certeza. E aí quem vive do skate continuará vivendo, e quem só quer brincar com ele continuará brincando. E o impacto no nosso mercado não será tão grande como é hoje.
A conclusão que eu chego é a seguinte: o skate tá aí pra qualquer um pegar e fazer o que quiser. Cabe a você decidir como vai andar e onde vai botar a sua grana (ou a grana do papai). Mas deixo um conselho: invista em marcas que trabalham direito, que tem uma equipe boa e bem remunerada, que sabem o que fazem em cima do skate. Se você ama essa porra, dê o seu dinheiro pra quem vale a pena e vai melhorar o mercado, seja uma marquinha pequena que está começando ou uma multinacional que está fazendo bem ao skate.
O que você acha de tudo isso? O que achou do primeiro post da nova seção, a Black Mind? Acha que o skate precisa de mais discussões assim? Espalhe o post e deixe seu comentário aí!