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Marc Johnson – Jenkem

Você PRECISA ler esta entrevista dada pelo Marc Johnson à Jenkem Mag. Quem mandou as perguntas foi o Ian Michna, e Marc respondeu via email.

Um dos motivos da Black Media ser um site e não uma revista é a agilidade. Eu li esta entrevista ontem, entrei em contato com os caras da Jenkem, e eles autorizaram a tradução completa do texto pra ser publicada aqui. Tá tudo certo!

Gastei um tempinho traduzindo a entrevista inteira, porque acho importante todo mundo ler. E ler tudo. O cara falou coisas que só quem vive o mercado há muitos anos poderia saber, e você pode pegar um atalho nas experiências dele. Sem mais enrolação, leia TUDO:


Brian Anderson deixou a Girl, Dill e AVE deixaram a Alien (Workshop) e mais mudanças ainda estão por vir em outras marcas. Por que as pessoas estão tomando decisões tão drásticas do nada? Como essas mudanças afetam o skateboard como um todo?
Eu te digo porque eles estão tomando essas decisões drásticas. Vou colocar como uma história:

Vamos dizer que você construa casas. Alguém te liga e oferece um emprego pra construir a casa dele. Eles sabem usar martelo e serra, mas não podem construir a casa sozinhos. Então eles “contratam” um punhado de ótimos carpinteiros para construir a casa pra eles. É mais fácil assim. Todo mundo divide o trabalho. Vamos dizer que demore anos para que a casa fique pronta e, assim que ela está de pé, seu emprego acaba. Você sai. Se você volta pra esta casa querendo viver lá, ou mesmo só dormir, será jogado pra fora. “Mas eu construí esse lugar”, você pode dizer. Mas o dono vai dizer: “Sim, mas eu PAGUEI você pra isso. Agora está terminada. Sai fora.” E adivinha? Ele está certo. Você construiu a casa DELE. Não a sua.

Talvez as pessoas estejam cansadas de construir casas para os outros. Talvez elas queiram suas próprias casas. E eles tem a experiência necessária. Mais casas deveriam ser construídas por pessoas com experiência no skate. Mais casas devem ser construídas por pessoas que sabem filmar uma parte, que já foram em alguma tour de merda com algum babaca lhe dando ordens. Pessoas que já passaram o inferno no skate, ao invés de caras que usam o skate para ganhar muito dinheiro enquanto cagam na cara dos skatistas ano após ano, contrato após contrato. Eu digo: VAI NA FÉ. O skate deve estar nas mãos dos skatistas.

Reprodução/None Co.

Você já disse em uma entrevista: “Skate é algo no qual você entra por não querer seguir as regras, mas olhe pra nós agora. São só regras – você não pode fazer isso, essa manobra não é legal, etc…”. Mas esse não foi sempre o caso? Cada década tem suas próprias regras do que é legal, o que não é, o que é permitido…
Sim. Na verdade, sempre foi assim. Não há regras de verdade no skate, mas sempre houve algumas implícitas na comunidade skatista. Essas regras mudam e evoluem como todo o resto. A época atual é muito boa no skate, na verdade. O skate não está limitado ao que um monte de caras de 16 anos diz que é legal. Você consegue imaginar? Moleques de 16 anos no comando do skate? Isso chegou a acontecer no começo dos anos 90. Se você não dava tal manobra ou não usava tal roupa, não conseguia patrocínio ou até saía dos que já tinha. Os caras do vert sentiram isso pra valer. E alguns caras do street também. O skate mudou muito ao longo dos anos. Era uma época difícil de ser skatista. Agora, há mais diversidade e mais tipos de skate são aceitos, promovidos e apoiados. As marcas apoiam tipos diferentes de skate.

Ainda há um conjunto de regras implícitas, mas são mais maleáveis e facilmente quebradas se o cara certo chega na cena. O que é “legal” muda todo o tempo. E o que é engraçado é ver que tem pessoas que, publicamente, odeiam alguém ou alguma coisa, mas seguem a moda quando um grupo aceita tal pessoa ou tal coisa. De hater a otário da noite pro dia. Isso mostra do que essas pessoas são feitas. Tem muito disso no skate, caras que seguem a moda. A mentalidade da moda. Grupos que tem que se unir para formar um único pensamento. Eles são uma piada. Eles seguem qualquer coisa que esteja na moda no momento, pra manter o pé no skate e segurar o seu lugarzinho porque, pessoalmente, não tem nada a oferecer para o skate. Eles só ocupam espaço e concordam com o que a maioria diz. Vão do amor ao ódio da noite pro dia, e vice-versa. Adoro ver quando isso explode na cara deles, como se fosse um cocôzão explodindo.

Você estava na primeira temporada do Street League, mas depois saiu. O que houve?
Fui excluído porque desloquei meu tornozelo filmando pro Pretty Sweet. Dyrdek fez um de seus assistentes me tirar. Fiquei feliz de ter saído. Acho da hora ver os caras mandando bem no “Street” League, mas eu não poderia lidar com toda aquela coisa de TV, regras e condições. Mas foi bem divertido andar na primeira temporada com os caras que eu nunca consigo encontrar. Mas não é meu tipo de coisa. Não chego nem perto da “Street” League.

Você já usou esteróides ou algum tipo de droga que melhore o desempenho no skate, seja em um campeonato ou para filmar alguma parte? Já te ofereceram?
Sim, eu usei drogas para melhorar o desempenho durante um certo vídeo. Tomei uísque e cerveja para andar sob pressão. E sim, a cerveja e o uísque me foram oferecidos. Vodka e vinho tinto foram ideias minhas. A culpa é minha e tenho vergonha de admitir que tomei isso. Eles me ajudaram, de certa forma, a enfrentar um dos períodos mais difíceis da minha vida. Meu prêmio de Skater Of The Year vai ser revogado agora? Estou limpo faz um bom tempo.

Como você se mantém tão humilde?
Eu não diria que sou uma pessoa humilde. Apenas sei que não sou melhor que ninguém por ser um skatista profissional ou qualquer outra coisa. No geral, não sou especial. Quer dizer, sou. Todos somos. Todos cometemos erros e temos potencial. Eu sou apenas alguém que cometeu muitos erros, reconheceu e tentou, realmente, aprender com isso. Pessoas espertas fazem boas escolhas. Isso é ser esperto. Uma pessoa humilde simplesmente sabe que não sabe de tudo, aceita isso e tenta se melhorar. Não tenha orgulho de ser um idiota, tenha orgulho de qualquer esforço honesto para parar de ser um.

Reprodução/YouTube

Se uma grande empresa de tênis esportivos te pagar duas ou três vezes mais, você sairia da Lakai?
Ok. Não, eu não andaria por uma grande empresa esportiva. Eu não andaria pela Grande Empresa Esportiva.

Por que?
A GEE (Grande Empresa Esportiva; grave a sigla) tem uma política de fazer as skate shops, ao comprar UM tênis que todos querem, levarem no pacote TODOS os tênis. São FORÇADOS a levar todos os tênis. Quando isso tudo não vende, as skateshops ficam em dívida, que cresce e cresce até que a loja quebre. Sua skateshop local deve uma baita grana para a GEE e precisa continuar a vender o tênis popular para pagar as contas, mas a dívida só cresce porque os tênis da GEE não vendem de jeito nenhum. Ninguém os quer. Mas a skateshop é forçada a levá-los para poder vender o que todo mundo quer. E, agora, a skateshop não pode nem escolher o que comprar. Os tênis aparecem randomicamente na loja, e aí a skateshop deve à GEE por produtos que nem pediu.

Quem é que faz isso com uma skateshop???

Obviamente, alguém que não liga pras skateshops, pro skate ou pros skatistas. É terrível. Marcas de Tênis de Skate não fazem isso com as lojas. MTS (mais um sigla, anota aí!) deixam o lojista decidir o que quer comprar. MTS não forçam as skateshops a fazer algo que não queiram, ou forçá-los a entrar em uma dívida escravocrata.

A razão de algumas marcas de tênis de skate estarem com problemas é o “sim” de algumas pessoas à GEE. Algumas pessoas decidiram pegar esse dinheirão, e aí outras seguiram, e depois mais algumas. Essas pessoas, que pegaram o cheque, legitimaram as GEE no NOSSO mercado. Alguns profissionais são pagos para apoiar o envolvimento da GEE no skate, e aí os moleques pensam: “Bom, se tal cara e tal cara estão dizendo, então deve ser legal.” As crianças crescem achando que a GEE no skate é normal. Eles não sabem que houve um tempo em que o skate não era popular e a GEE não chegaria nem perto.

Divulgação/Lakai

A GEE nunca ligou pro skate, até ver quanto dinheiro estava envolvido nisso. BILHÕES de dólares são gerados pelas empresas envolvidas no skate. Milhões de crianças andam de skate, que já foi aceito pela sociedade como uma atividade dos jovens. E uma atividade muito lucrativa se você está no negócio de vender produtos pro skate. O skate se tornou tão mainstream que até pessoas que não andam estão comprando roupas relacionadas ao skate.

A cultura jovem é um negócio muito lucrativo e, agora que o skate é uma grande parte disso, muitas empresas chegam de limusine no skatepark e começam a preencher os cheques. Porque ninguém vai ligar pras GEE se elas não tiverem profissionais bem respeitados dizendo aos garotos que é legal. Então, a GEE preenche esses grandes cheques, e a maioria dos pros olha pro número e diz: “Isso é mais dinheiro do que eu vou ganhar em três vidas andando pras marcas menores. Tenho que fazer o melhor pra mim.”

Leiam de novo: “Tenho que fazer o melhor pra MIM.”

Dá pra entender também. Porra, você se joga de escadas por 10, 15 anos e mal consegue pagar suas contas, e aí vem um cara que parece skatista, contratado por alguém de terno, e te oferece mais dinheiro do que você verá em 100 anos. Provavelmente, você vai aceitar. Você tem que fazer o que é melhor para VOCÊ, certo? Sim, você provavelmente vai pegar a grana.

A carreira média de profissional dura uns cinco anos, e a maioria dos pros sai do negócio sem nada, a não ser duas partes de vídeo e uma sala cheia de pro models antigos. Saem do negócio sem nada útil fora do skate, muito menos dinheiro. Você acha que as marcas de skate ligam pros skatistas depois que eles param de ser úteis e vendáveis? NÃO. O skatista fica por conta própria. Nenhuma empresa vai cuidar do futuro do seu pro favorito. É assim que funciona. Eu estou vendo isso por 23 anos.

Reprodução/YouTube

Depois que saem, os pros ficam sem nada. Sem experiência ou habilidade para conseguir emprego no “mundo real”. Quanto mais você for um profissional que não aprende nada além de manobras, menos atrativo você se torna pro mercado fora do skate. Chega um ponto em que você não vai conseguir praticamente nada fora do skate. É um dilema. Você passa anos fazendo o que gosta, e não tem tempo de se preparar para a vida depois do skate.

Não importa como acontece, quando um pro não é mais útil pra marca, é despejado. Às vezes, eles cagam em cima do cara assim que ele sai pela porta. Não se importam com o que acontece com ele. Não é problema deles. Tal profissional se jogava em escadas e corrimãos pela marca, fez a marca ser respeitada, deu o coração e alma e, depois de tudo, está sozinho. A empresa pagou um dinheirinho pra ele fazer todas essas coisas incríveis, ele viveu seu sonho por um tempo e, depois disso, é um inútil.

Não é surpresa que os caras peguem o dinheiro! Eles já viram seus amigos se darem mal nas marcas! Estão pegando a grana enquanto podem e montando algo paralelo, pra quando as marcas o chutarem pro lado.

Há dois lados nessa moeda. Vou apenas dizer que algumas das pessoas mais sombrias, baratas, gananciosas e desonestas são ex-skatistas que estão no comando de marcas “core”. Só porque a empresa é core não significa que as pessoas no comando são boas. São apenas pessoas tentando fazer o máximo de dinheiro possível. O fato de eles terem andando por alguns anos não significa nada se eles são imbecis egoístas. E, na maioria das vezes, esses ex-skatistas SÃO imbecis.

Agora que as GEE compraram sua entrada no skate e a credibilidade das ruas, coisa que não poderiam construir com skate de verdade, as empresas do core estão tendo que levantar a bunda e fazer alguma coisa. A GEE é boa nos negócios, eficiente. Estão dispostas a pagar aos skatistas algo próximo do que eles realmente valem, ao invés de dar um troco “porque skatistas são burros e vão aceitar qualquer coisa.” As GEE assustaram as marcas, que agora tem que comandar seus negócios adequadamente, se esforçar e tratar os caras da marca de forma apropriada. “Nós somos fodas no skate. Não precisamos ser bons com esses caras. Não precisamos saber como cuidar deles. Azar o deles, o que vão fazer?” Bom, agora os skatistas podem ir para as grandes marcas. E as marcas do core estão assustadas.

Reprodução/YouTube

Parece que o problema foi que as empresas do core ficaram muito confortáveis e não se atualizaram, não usaram o bom senso a tempo. Como uma preguiça gigante, essas grandes MTS estavam dormindo quando as GEE vieram e roubaram as galinhas de noite. As MTS, por mais rápido que tivessem mudado suas atitudes, não conseguiram fazer nada. Agora, todo mundo corre de um lado pro outro com a bandeira de “Feito por Skatistas”.

Ninguém realmente ligava pra “feito por skatista” antes das GEE ameaçarem as empresas do core. E, com certeza, ninguém estava prestando atenção às práticas do negócio e às relações com os skatistas antes das GEE chegarem e tratarem os caras bem. Era só pizza e refri no chão da sala, enquanto o dono da marca core estava em sua casa na praia bebendo Piña Colada e falando sobre a próxima reunião de vendas.

As GEE podem estar matando as skateshops e outras marcas só pela ganância, mas eles cuidam bem dos skatistas e os ajudam a ter o que querem. Eles até vão mais longe pelos caras. Com certeza, esta é uma situação estranha pra ser um pro. Você cuida de si próprio e sacrifica um pouco do skate? Ou apoia o skate, as skateshops e as boas relações entre as partes, fazendo menos dinheiro do que poderia?

É ir com a gigantesca e gananciosa matadora de skateshops, destruindo e engolindo tudo que você ama, mas que trata os skatistas como os valiosos atletas que são, OU manter-se no core e apoiar as marcas que trabalham com as lojas e privilegiam o fortalecimento da indústria como um todo mas que, com os skatistas, tem uma relação que termina em negligência, desonestidade e frieza quando este não tem mais valor pra ela. Isso tudo são negócios, não skate.

Vou falar: grande ou pequena, uma marca não é merda nenhuma até os SKATISTAS dizerem que é. Ponto final. Qualquer um pode ter produtos. É o skatista quem diz o que é a marca. São eles que legitimam a marca, para que as crianças queiram seus produtos. Sâo eles que, no fim das contas, vendem o produto. E adivinha? A maioria das marcas tratam os skatistas como idiotas. Muitas empresas veem os skatistas como ignorantes, que não sabem ler um contrato e vão aceitar qualquer coisa porque não sabem de nada. Uns 3 ou 5 zeros parecem bons pra caralho.

A verdade é que algumas marcas vendem MUITO porque os skatistas fizeram a marca valer alguma coisa e, dificilmente, esse dinheiro é dividido com eles. Comparado à arrecadação anual, os skatistas recebem mixaria.

Na minha opinião, isso é ridículo. Grande ou pequeno, todo mundo tá nisso pela grana. Como eu disse, há muito dinheiro no skate. A única diferença é como cada marca opera. Às vezes, os skatistas tomam decisões melhores que pessoas sem experiência e amor pelo skate. O tipo de amor que só quem anda consegue sentir. O mundo está mudando. As pessoas precisam acordar e olhar para o modo como fazem negócios. Você não precisa se sentir ameaçado para ganhar dinheiro. Você não precisa cagar nas pessoas pra ser bem sucedido. Simplesmente não precisa.

Reprodução/YouTube

Pessoalmente, eu não andaria pra uma GEE, mas isso é porque eu tenho um investimento pessoal com quem eu negocio. Talvez eu seja ingênuo e meu investimento não seja recíproco, mas eu gosto das marcas com as quais trabalho. Skatistas tomam as decisões em quase todas as marcas com as quais eu trabalho. Eu sei mais do que gostaria sobre o negócio do skate e, ao longo dos anos, ouvi o que os valentões do core falam com as portas fechadas. Skatistas falam. Skatistas AMAM falar. Na minha opinião, as pessoas deveriam tomar decisões embasadas sobre o que comprar e quem apoiar. Se ninguém está dizendo às crianças como são os dois lados, como elas podem tomar decisões inteligentes?

Investi muito tempo, esforço, meu coração e minha alma na Lakai. Porque os skatistas são os donos, comandam a marca e desenham os tênis. Skatistas filmam os vídeos e eu realmente gosto da equipe. Cresci e fui influenciado por todo mundo envolvido na Lakai. Sei quem são. Eles me pagam muito bem e tratam as lojas como elas devem ser tratadas. É um parceria de verdade. Nós precisamos de skateshops. Amamos skateshops, porque somos a mesma coisa: SKATISTAS.

A Lakai não precisou comprar meu apoio. Eu os apoio muito antes de entrar pro time. Andei com shapes do Rick Howard, Mike Carroll, Kelly Bird, Scott Johnston, e agora trabalho com eles. Já fiz tour com eles e vi o stress deles filmando. Eles me ajudaram em um período horrível de alcoolismo, e ficaram ao meu lado mesmo depois de comportamentos babacas. Eu ando por uma marca criada por pessoas que sabem o que eu passo e passam tudo junto comigo. É isso que eu apoio.

Me desculpe por essa resposta. Fiquei pensando se falava ou não tudo isso. Sou um skatista, e sou muito agradecido por estar onde estou.

Do que você tem mais orgulho na sua carreira até agora?
Só agradeço por chegar e conseguir me manter aqui. Fico feliz de poder ajudar algumas pessoas a chegarem onde queriam, e ter percebido meu próprio potencial até agora. Ainda bem que, depois de todo esse tempo, sou uma pessoa e um amigo melhor do que quando comecei. Já tive minha fase ruim, mas acho que sou uma pessoa melhor por ter passado tudo isso e aprendido.


entrevista por Ian Michna
tradução por Felipe Minozzi (Fel)
Artigo original

Thanks, Jenkem Mag!

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